A forma como nos comunicamos na internet mudou muito. A linguagem corporal e o tom verbal não são transmitidos em nossas mensagens de texto ou e-mails. Quando enviamos um emoji, seja por e-mail, mensagem de texto ou rede social, na verdade, não estamos enviando uma imagem, mas sim um código Unicode, que é traduzido para o significado da imagem.
A mudança mais proeminente no nosso comportamento online foi a adoção de duas linguagens hieroglíficas: emoticons e emojis, criando maneiras alternativas de transmitir um significado diferenciado. O emoji já é parte de nossa linguagem.
Criados no final dos anos 90 por Shigetaka Kurita, os emojis seriam destinados a um serviço de internet móvel exclusivo para o Japão. No primeiro iPhone, lançado em 2007, a Apple incluiu um teclado com emojis para atrair clientes japoneses e logo tornou-se conhecido e usado pelo mundo todo.
Os emojis são uma maneira divertida e cada vez mais onipresente para as pessoas se expressarem, mas podem suscitar novas questões legais, potencialmente complexas, sobre propriedade intelectual.
Emoticon e emoji não têm o mesmo significado. Muitos pensam que emoji e emoticon são a mesma coisa, porém, esses termos possuem conceitos diferentes.
Emoticon é um termo criado a partir das palavras inglesas emotion (emoção) e icon (ícone). É uma representação gráfica para expressar emoções, pensamentos, por meio dos caracteres tipográficos do teclado (computador, tablet, celular etc.). Não há uso de imagem para se comunicar no emoticon. Ele é usado com combinações de sinais de pontuação, por exemplo, 🙂 ou ;).
Emoji é o resultado da junção das expressões japonesas e (imagem) e moji (personagem) e é uma evolução dos emoticons. É uma imagem digital, estática ou animada, ou um ícone usado para expressar uma ideia ou emoção na comunicação digital. Há uso de imagem, não de textos. São pictogramas (símbolos pictóricos: símbolo que representa um objeto ou conceito por meio de desenhos figurativos). Eles representam imagens como rostos, clima, veículos e edifícios, comida, bebida, animais, plantas ou ícones que representam emoções, sentimentos ou atividades.
Os emojis estão sujeitos a uma gama mais ampla de representações que os emoticons. Isso porque podem ser literalmente qualquer coisa, enquanto os emoticons são limitados a caracteres do teclado, por exemplo, 😉 ou 😀 ou 😮 :’( .
Um emoji, às vezes, vale mais que muitas palavras. Eles são usados, principalmente, no ambiente digital e fazem parte de nossa comunicação diária, nas redes sociais e aplicativos de mensagens, como forma de manifestação de nossas emoções. É uma linguagem nova na era digital.
Segundo a revista britânica The New Scientist, cerca de 3,2 bilhões de pessoas usam a internet, e três quartos delas via smartphones equipados com emojis. Nas redes sociais, mais de 90% dos usuários se comunicam por emojis, e são trocadas em média 6 bilhões de mensagens diariamente com a presença dessas “carinhas”[1].
Em decorrência de uma mudança global na forma de se comunicar digitalmente, as empresas estão usando os emojis para alavancar suas vendas ou até para identificar algum produto ou serviço da corporação. Mas até que ponto esse uso é legal? Existem limites para o uso de emoji e abordaremos um pouco desse tema aqui. Alguns cuidados devem ser tomados com a utilização dos emojis como mote em suas campanhas publicitárias.
O fato de todo mundo usar os emojis não significa que não existem regras a serem seguidas. Os emojis são protegidos por direito autoral, pois a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.609/1998), em seu artigo 7º, inciso X, prevê que “são obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza”.
Para ter a proteção autoral, não é necessário o registro da obra, porém, é recomendável, para efeitos de comprovação de autoria e anterioridade. O criador do emoji tem direito sobre ele desde a sua exteriorização em suporte físico, tangível, inclusive digital, e os direitos patrimoniais do autor perduram por 70 anos, a contar de 1º de janeiro do ano subsequente da morte do autor.
Além da proteção por direitos autorais, os emojis também podem ser usados e registrados como marcas com logotipo, se eles distinguem produtos ou serviços no mercado. Nesse caso, constituirão um direito de propriedade e serão tutelados pela Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96).
Esse registro de marca é válido por tempo indeterminado, desde que sejam promovidas as prorrogações decenais perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Com o registro de emoji como marca no INPI, o titular pode impedir que terceiros usem o emoji (configuração visual de linhas e cores e imagem) sem sua autorização.
No entanto, a Lei de Propriedade Industrial exige que o titular de uma marca registrada use a marca após cinco anos de sua concessão, sob pena de ter seu registro extinto, por falta de uso, se houver questionamento de algum terceiro com legítimo interesse e caso não seja comprovado o uso do emoji como marca, o registro poderá ser extinto pelo INPI.
Para ter proteção marcária, o emoji deve exercer a função de signo distintivo: distinguir um produto/serviço de outro idêntico ou afim, de origem diversa e deve ser visualmente perceptível. Porém, no Brasil, não é possível proteger marcas “não tradicionais”. Assim, se o emoticon tiver algum movimento/captura de movimentos ele não poderá ser protegido, como marca, em nosso país.
No Brasil, a sociedade Emoji Company GMBH registrou a marca “emoji”, perante o INPI, em diversas classes de produtos e serviços (cosméticos, joias, materiais impressos, vestuário, desenhos animados etc.). Todavia, existem outras sociedades que também são titulares de marcas formadas pela expressão emoji, por exemplo: “animoji”, “memoji”, “pizzaria emoji”, “3d cutemoji”, “repelentes emoji”, para identificar computadores, lanchonetes, smartphones, repelentes contra insetos etc.
Um ponto a ser pensado, ao requerer a proteção de um emoji como marca, é que muitos deles são visualmente semelhantes e podem ser difíceis de distinguir de outros existentes, especialmente quando exibidos em fontes pequenas ou por diferentes aplicações, já que nenhum padrão especifica exatamente como devem ser exibidos.
Em alguns casos, a marca de um emoji pode ser tida como genérica ou comum. Citamos um exemplo: O INPI analisou o pedido de registro para a marca “emojinho”, com o logotipo de um smile sorrindo e com óculos escuros, para identificar brinquedos. O INPI entendeu que essa imagem não pode ser registrada, por um só titular, como marca, porque foi considerada como sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo. Não houve interposição de recurso e o processo foi arquivado.
O entendimento do INPI foi de que os emojis (e outros similares) são comuns, pois são amplamente usados há muitos anos. O smile foi desenvolvido em 1963 pelo artista Harvey Ball, contratado para desenhar uma carinha sorridente para fazer os funcionários da empresa State Mutual Life Assurance Company um pouco mais felizes, em homenagem ao Dia Mundial do Sorriso.
Nesse cenário, é preciso destacar que existem duas categorias de emojis, o Unicode e os emojis proprietários[2]. O emoji unicode não é um programa de software, nem uma fonte, mas um padrão de codificação universal de caracteres, mantida pelo Unicode Consortium (Consórcio Unicode: organização sem fins lucrativos que coordena o desenvolvimento e a promoção do Unicode, para caracteres do teclado e, mais recentemente, emojis).
No caso dos emojis proprietários, as plataformas também podem implementar emojis que funcionam apenas nelas. Portanto, quando um emoji proprietário é usado fora de sua plataforma, ele geralmente aparece como um símbolo. Isso indica que a plataforma destinatária não reconheceu aquele caractere.
Os padrões Unicode permitem que os emojis sejam reconhecidos entre plataformas. Qualquer pessoa ou empresa pode enviar uma proposta para um caractere emoji para a Unicode Consortium, que deve seguir alguns critérios e diretrizes estabelecidos pelo consórcio. O Unicode oferece o código dos emojis, em preto e branco, mas a versão colorida é de propriedade da plataforma ou sistema operacional que o disponibilizou (o modelo de seu aparelho pode interferir). É possível perceber como um mesmo emoji aparece de maneira diferente em outro modelo de celular pelo site Emojipedia.
Todavia, o Unicode não atribui um código numérico aos emojis proprietários. Por exemplo, emojis proprietários de marca pertencentes a terceiros, que são usados como emojis corporativos ou criados para uma campanha, não possuem um Unicode[3].
Os emojis desfrutam da mesma proteção que qualquer outro trabalho visual. Assim, como são protegidos por direitos autorais, eles pertencem ao seu criador. Uma produtora de um filme recente também teve que ter a licença sobre o uso dos emojis, tema principal do filme.
É preciso ressaltar que não é permitido simplesmente copiar um emoji encontrado na internet, no aplicativo etc. e fazer o que quiser com ele, deve-se respeitar as regras de proteção à propriedade intelectual dos seus titulares. Por exemplo, a Apple detém os direitos autorais do seu conjunto de emojis, a Samsung deles, o Facebook deles e assim por diante.
Pode-se usar esses emojis para dizer ou comunicar alguma ideia, sentimento ou emoção na internet, chats de bate-papo, e-mails etc., mas para reproduzir esses emoticons com finalidade comercial e/ou publicitária, será necessário obter uma licença do proprietário.
Existem emojis que podem ser livremente utilizados, por exemplo, com o Phantom Open Emoji, que disponibiliza um conjunto de emojis amigável de código aberto. Mesmo nesses casos, é necessário seguir as regras e diretrizes e verificar se existem restrições quanto a esse uso, a extensão da licença da imagem etc.
Portanto, para não se envolver em disputas jurídicas, especialmente quando se tem finalidade comercial dos emojis, é importante verificar, por exemplo, se o uso viola os direitos de propriedade intelectual de terceiros; os termos de licença; as condições de uso e hipóteses de uso justo (fair use). As informações técnicas são essenciais para não incorrer em violações ou indeferimentos dos pedidos de registro pelo INPI.
[1] https://www.mackenzie.br/noticias/artigo/n/a/i/mackenzie-comemora-o-dia-mundial-do-emoji/
[2] https://www.wipo.int/wipo_magazine/en/2018/03/article_0006.html
[3] https://www.forbes.com/sites/oliverherzfeld/2019/10/24/the-legal-implications-of-emoji/#6eee47846bbd